Do planejamento impossível ao possível planejamento

O assunto educação financeira ganhou bastante relevância nos últimos anos.

Diversos agentes da sociedade, de empresas ao governo, têm investido no tema,

cada um à sua forma. A despeito do interesse geral, pouco se fala a respeito dos

motivos que alçaram o tema ao seu atual estágio. Olhando de forma retrospectiva,

a história da educação financeira no Brasil parece ter trilhado o caminho oposto do

que se poderia esperar,começou como sinônimo de dicas de investimento voltado

para aqueles já prósperos para apenas recentemente se tornar um recurso efetivo

de conquista da prosperidade.


Até o fim dos anos 1990, o assunto educação financeira concentrava-se nas

“dicas de investimento” dos especialistas em produtos do mercado financeiro, ensinando

como preservar ou multiplicar recursos a partir da compra de títulos dos

bancos, títulos públicos ou ações das empresas. Essas dicas eram, e ainda são,

claramente voltadas àquelas pessoas que de alguma forma já possuem recursos

disponíveis que podem ser alocados por certo tempo em algum dos produtos existentes

no mercado. O foco nesses casos nunca foi o de tentar mostrar o caminho

para a organização de um plano que resultasse em poupança.


Evidentemente, não se tratava apenas de uma escolha. Havia outras condições

que contribuíam para esse estágio. Altos índices de inflação, associados a baixa

bancarização, crédito escasso e pouco acesso à informação desenhavam um cenário

em que o brasileiro médio não conseguia planejar sua vida financeira, nem

a curto ou a longo prazo. Na verdade, mal via a cor de seu dinheiro, que circulava

rapidamente na troca por produtos necessários para o dia a dia das famílias a fim

de evitar a inevitável perda do seu poder de compra. Qualquer planejamento era

praticamente impossível.


Portanto, é claro que o atraso ou a demora no tratamento mais aprofundado e

específico da educação financeira tem relação direta com a histórica instabilidade

econômica do país, que só foi resolvida com o advento do Plano Real em 1994.


Essa instabilidade afetou de forma determinante a capacidade de planejamento dos brasileiros e minou por muitos anos qualquer tentativa de conceitos relacionados ao

planejamento e gestão de orçamentos familiares ou domésticos.

Com a melhora da situação econômica a partir de 1999, alguns determinantes

importantes para o conceito e a prática da educação financeira começaram a mudar.

Dois deles foram bastante relevantes nesse período: o controle da inflação e a

expansão da bancarização.


O crédito foi o terceiro determinante da trajetória da educação financeira. Veio

com força um pouco mais tarde, na esteira das melhores condições macroeconô-

micas, do ganho de renda - primeiramente por conta do fim do “imposto inflacionário”,

mais tarde pelo avanço da atividade econômica – e, recentemente, do

emprego formal. Nesse período, fomos testemunhas de uma verdadeira revolução,

com a grande disseminação do crédito por diversos setores da economia.


Esses fatores associados permitiam ao brasileiro de renda média a oportunidade

de compreender o conceito de planejamento financeiro. O que antes era impensável,

passou a ser plausível.


O novo perfil do consumidor


Para identificar esse comportamento atual do consumidor frente ao crédito,

a Boa Vista realizou uma pesquisa ainda em 2014. A intenção do levantamento foi conhecer a percepção do consumidor acerca de questões relacionadas a crédito e consumo. Procurou-se fazer um levantamento de estratificação por classe social, utilizando o critério FGV 2012 (por faixas de renda familiar). A amostra obtida foi de 967 respondentes, dos quais 44% representam a classe C e 50% as classes D/E.


Em linhas gerais, a pesquisa mostrou um amadurecimento do consumidor, cada

vez mais protagonista de sua vida financeira, algo muito saudável em relação ao uso

do crédito e ao consumo. Fatores como mais acesso à informação, intensificação de ações de educação financeira por parte de agentes do mercado, mais oportunidades

de planejamento e de controle favoreceram esta evolução observada nos últimos anos.


Artigo Publicado pela Boa Vista SCPC e escrito por Fernando Cosenza Araujo – Diretor de Marketing, Boa Vista SCPC. Mestre e Doutor em Administração Pública

pela EAESP-FGV e Flavio Estevez Calife – Economista, Boa Vista SCPC. Mestre e Doutor em Finanças Públicas pela EAESP-FGV.





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